sábado, 5 de março de 2011

O NEGRO NO MEIO ACADÊMICO

Negro precisa ser brilhante para se destacar no meio acadêmico, diz antropólogo que motivou política



Brasília - Em 1998 Arivaldo Lima Alves, estudante do curso de doutorado do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília (UnB), foi reprovado em uma disciplina obrigatória. Em 20 anos daquele programa de pós-graduação foi o primeiro aluno a ser reprovado. Dois anos após a reprovação, o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão forçou o departamento a rever a menção e Arivaldo foi aprovado.

O episódio, conhecido como “Caso Ari”, estimulou o orientador de Arivaldo, o professor José Jorge de Carvalho, a elaborar no ano seguinte a primeira proposta de cotas, embrião do atual sistema que está sendo questionado no Supremo Tribunal Federal (STF) por ação do partido Democratas.

Onze anos após o episódio, Arivaldo, hoje professor adjunto de antropologia da Universidade Estadual da Bahia, elogia a política de cotas adotada pela Universidade de Brasília (UnB) em entrevista à Agência Brasil.

Agência Brasil: O que você acha da política de cotas da UnB?

Arivaldo Lima Alves: É o primeiro programa entre as universidades públicas brasileiras que reserva vagas para negros e índios. Só por isso já tem uma grande importância. A partir do momento que a Universidade de Brasília, uma universidade pública federal, decide por adotar esse programa várias outras universidades tomam a mesma iniciativa e têm a universidade como referência. É um programa importante e que veio atender uma demanda social histórica.

ABr: A política de cotas existe há seis anos. Por que ela causa debate até hoje?

Arivaldo: Desde o final do século 19 e início do século 20, a sociedade brasileira, em especial as elites, vem elaborando um projeto de identidade nacional e de povo. Nesse projeto não cabia apontar e afirmar a identidade indígena e, muito menos, a identidade negra. Sabemos que de 1880 a 1930 o Brasil aprovou uma política imigratória que permitiu a absorção de quase 4 milhões de imigrantes brancos europeus. Em 300 anos de escravidão foi mais ou menos esse contingente de africanos que foi trazido forçadamente para o Brasil. Havia um projeto de embranquecimento. Depois disso, pouco a pouco, o país passa a se definir como nação mestiça. Na medida em que é aprovado um programa de reserva de vagas na universidade pública, no mercado de trabalho para negros e índios, esses projetos de nação são contestados. Se é afirmado que não existem apenas brancos e mestiços, mas também negros e índios é preciso levar em consideração demandas específicas. O Brasil aboliu a escravidão, mas não adotou nenhuma política pública para os ex-escravos ou para os descendentes de africanos que nos anos seguintes construíram a nação brasileira, mas não tiveram nenhum retorno material da contribuição que deram. Quando se adota um programa de cotas cria-se a possibilidade de que um segmento importante da população, cerca de 80% no caso da Bahia, exija acesso aos resultados da produção da riqueza, posições de prestígio, privilégios como participação na universidade brasileira e até postos de representação política. A Bahia nunca teve um governador negro ou Salvador teve um prefeito negro. Isso é um escândalo muito sintomático.

ABr: Como você vê o questionamento da política de cotas da UnB feita no STF pelo Democratas?

Arivaldo: Não me espanta, vejo com uma certa naturalidade. Se o Democratas, que sempre representou os interesses hegemônicos na sociedade brasileira, fosse a favor da políticas de cotas seria algo estranho. É natural que o partido reaja. Já ouvi senador democrata afirmando que o problema racial não existe entre nós. É um tipo de afirmação que contesta os dados oficiais como os do Ipea [Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada] e do IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística], que mostram que o acesso ao emprego, à educação, condições dignas de educação são diferenciados em relação a brancos e negros.
ABr: Há quem conteste as políticas de cota racial reconhecendo que a desigualdade existe mas é de classe e não de raça ou cor e, portanto, uma política de cota social seria mais objetiva, eficiente e mais justa. Esse argumento é falho?

Arivaldo: Aqueles que discordam das ações afirmativas para negros partem do princípio de que quem defende a política, como eu, acredita que exista a biologia das raças, a natureza das raças. Esse tipo de compreensão já caiu por terra desde a 2ª Guerra Mundial que exterminou judeus, negros, ciganos, homossexuais, ou seja, todos aqueles que eram considerados uma certa degeneração da humanidade. Para nós, a raça existe a partir de uma compreensão do negro socialmente. Defender cotas para negros é também defender vagas para aqueles que socialmente existem como tal. Eu não acredito que exista o negro como biologia, como raça. Mas a história social do negro nesse país, o modo como ele vive, o espaço onde ele está alocado nas grandes cidades, a representação que é feita dele nos meios de comunicação, na literatura ou no livro didático só evidencia que o negro a rigor não está em uma biologia das raças, mas é uma representação uma constituição do mesmo. Então, defender cotas para negros é defender cotas sociais.

ABr: Você acha que na universidade brasileira há racismo?

Arivaldo: Não tenho nenhuma dúvida disso. Basta ver a trajetória de alguns intelectuais negros. O Brasil tem intelectuais negros desde a primeira metade do século 20, mas se formos ver os anais da história poucos tiveram destaque. Um dos poucos que teve destaque foi o geógrafo Milton Santos, mas porque tinha um brilho excepcional e um tipo de trajetória dos negros que se destacam quando têm uma inteligência muito acima da média. Mas só se destaca um ou outro indivíduo não um grupo social como um todo.

ABr: Precisa ser brilhante?

Arivaldo: Mais do que brilhante, acima da média. Entre os brancos se destacam os brilhantes e os que não são tão brilhantes assim, mas que conseguem se adequar a uma certa expectativa ou reproduzir um certo modo de parecer ser brilhante.


ABr: Passados onze anos do episódio "Caso Ari" no Departamento de Antropologia da UnB, como avalia aquela situação?

Arivaldo: Foi uma experiência muito dolorosa que marcou minha trajetória pessoal, acadêmica e profissional. A partir dali eu redefini meu projeto pessoal e de inserção acadêmica. Essa obrigação de redefinir projetos trouxe certo desconforto. De outro ponto de vista, diria que não apenas eu, mas aqueles que estiveram do meu lado fomos vitoriosos. Uma questão que parecia ser de ordem pessoal ia ganhar a dimensão que teve e ia ter como resposta medidas que não beneficiariam diretamente a mim, mas um segmento que há séculos vem sendo abandonado e maltratado. Apesar da dor e dificuldade que eu particularmente tive, foi algo importante. Eu passei a compreender o que é a trajetória intelectual de um negro no Brasil, passei a entender de outra maneira o establishment da universidade pública brasileira e compreender como a ciência, como a antropologia, podia me ajudar a compreender a minha realidade, a minha condição de pesquisador e de cidadão.
Gilberto Costa - repórter da Agencia Brasil
www.conselhos.mg.gov.br/conepir/noticia/negro-precisa-ser-brilhante-para-se-destacar-no-meio-academico-diz-antropologo-que-motivou-politica

terça-feira, 12 de outubro de 2010

A DITADURA DILMA

Por Guilherme Fiúza

A DITADURA DILMA

A opinião pública brasileira chegou a um estado inédito de letargia. Do alto de seus quase 80% de aprovação, Lula pode dizer qualquer coisa. O bom entendedor está arrepiado.

Em sua excitação de Midas eleitoral, com a candidata fantasma disparando nas pesquisas, o presidente fala pelos cotovelos – e seus cotovelos andam dizendo barbaridades.

A mais grave delas, para variar, passou despercebida. Reclamando do Senado Federal, que lhe foi menos servil do que ele desejava, Lula anunciou:

“Penso em criar um organismo muito forte, juntando todas essas forças que nos apóiam, para que nunca mais a gente possa permitir que um presidente sofra o que eu sofri”.

A declaração feita num palanque em Recife, onde o presidente tornou-se uma espécie de semideus, é um escândalo. Ou melhor: seria um escândalo, se o Brasil não vivesse nesse atual estado de democracia anestesiada.

Lula está anunciando um “organismo” político para neutralizar o Congresso Nacional. É o presidente da República, de viva voz, avisando que as regras da democracia não servem mais. Quer usar a ligação direta com as massas para enquadrar o Senado. O mais famoso autor de uma idéia desse tipo foi o führer Adolf Hitler.

Se o Brasil não estivesse imerso no sono populista, Lula teria que ser convocado imediatamente ao Congresso para explicar que “organismo” é esse.

As cartas estão na mesa, e são claras. Todas as tentações autoritárias da esquerda S.A. estão fervilhando com a disparada de Dilma, a candidata de proveta, na corrida presidencial. Chegou a hora de submeter o Congresso, a imprensa e as leis à República dos companheiros.

Luiz Inácio falou, Luiz Inácio avisou: está sendo urdida uma força para-estatal para dar poderes especiais ao governo Dilma.

A vitória no primeiro turno seria o passo inicial do arrastão. Depois viria a Constituinte petista, com a enxurrada de “controles sociais” e “correções democráticas” que o país já viu sair das conferências xiitas bancadas por Lula.

Brasil, divirta-se com a brincadeira de votar na mamãe. Depois comporte-se, porque o organismo vem aí.

Guilherme Fiuza é jornalista e autor de vários livros, entre eles “Meu Nome não é Johnny”, adaptado para o cinema. Texto publicado originalmente no site /http://colunas.epoca.globo.com/guilhermefiuza/2010/08/28/a-ditadura-dilma/

domingo, 10 de outubro de 2010

ESTADO E RELIGIÃO

A LAICIDADE DO ESTADO COMO FORMA DE PRESERVAÇÃO DA LIBERDADE RELIGIOSA E SOCIAL

Introdução

O objetivo deste trabalho é demonstrar de forma clara, que a separação conceitual e material entre Estado e Religião é o fundamento básico para garantir a liberdade do cidadão dentro de uma sociedade organizada e tutelada por um tipo de Estado. Liberdade esta não só no aspecto religioso, mas abrangendo de forma tácita tanto o pensamento, a cultura, bem como a própria dinâmica das interações sociais, as quais sofrem influência direta tanto da Religião como do mesmo Estado.


A Laicidade é a forma institucional que possibilita nas sociedades democráticas a relação política entre o cidadão e o Estado, e entre os próprios cidadãos. No início, onde esse princípio foi aplicado, a Laicidade permitiu instaurar a separação da sociedade civil e das religiões, não exercendo o Estado qualquer poder religioso e as igrejas qualquer poder político.


Para garantir simultaneamente a liberdade de todos e a liberdade de cada um, a Laicidade distingue e separa o domínio público, onde se exerce a cidadania, e o domínio privado, onde se exercem as liberdades individuais (de pensamento, de consciência, de convicção) e onde coexistem as diferenças (biológicas, sociais, culturais). Pertencendo a todos, o espaço público é indivisível: nenhum cidadão ou grupo de cidadãos deve impor as suas convicções aos outros. Simetricamente, o Estado laico proíbe-se de intervir nas formas de organização coletivas (partidos, igrejas, associações etc.) às quais qualquer cidadão pode aderir e que relevam do direito privado.


A Laicidade garante a todo o indivíduo o direito de adotar uma convicção, de mudar de convicção, e de não adotar nenhuma. A Laicidade do Estado não é, portanto uma convicção entre outras, mas a condição primeira da coexistência entre todas as convicções no espaço público.


No Brasil, a separação material entre a Igreja e o Estado foi efetivada em 7 de janeiro de 1.890, pelo Decreto nº 119-A, e constitucionalmente consagrada desde a Constituição de 1.891. No período anterior a 1.890, o catolicismo ( da Igreja Católica Apostólica Romana) era a religião oficial do Estado e as demais religiões eram proibidas, em decorrência da norma do art. 5° da Constituição de 1.824. O catolicismo era subvencionado pelo Estado e gozava de enormes privilégios.


Durante o período em que o Brasil, como colônia, reino unido e posteriormente império, esteve sob a égide de um Estado religioso católico a Igreja exercia grande influência sobre os governos e sobre o parlamento, contribuindo dessa forma para adoção de normas jurídicas que conduziam a sociedade a uma maneira de viver e de pensar e de se relacionar de acordo com a forma que pensava a ideologia dominante do alto clero da Igreja Católica. Há de se convir que nem sempre o que é ideologicamente analisado, tem na realidade prática uma efetiva utilidade tanto individual como social. Enquanto que a imensa e esmagadora maioria da população brasileira era essencialmente rural, a igreja era Urbana, enquanto os brasileiros viviam na escuridão do analfabetismo os ministros da Igreja (Padres, Bispos,Frades) celebravam missas e outros sacramentos em Latim.


Não se deve apenas ao fato de o Estado adotar a religião Católica com fator preponderante da influência da mesma na organização social, bem com na cauterização do pensamento da sociedade. Havia ainda a atuação parlamentar religiosa da Igreja, haja vista a presença de membros do clero exercendo a atividade parlamentar e em alguns casos até a de governo (Regente Feijó, governando o Império no período da menoridade de Dom Pedro II). Dessa forma a Igreja exercia não só a função religiosa como também de Estado, legislando, governado e jurisdicionando.


Neste período ainda de junção siamesa de Estado e Igreja, certidão de nascimento e celebração de casamento eram realizados exclusivamente pela Igreja. Atos da vida civil seguindo o rito e a previsão de acordo com a liturgia religiosa oficial do Estado.


Esse poder demonstrado pela Igreja não era resultado tão somente da adoção da religião católica pelo Estado brasileiro, mas principalmente pela influencia da mesma sobre o governo e parlamento, editor e legislador das normas jurídicas. Ou seja a Igreja tinha o controle sobre o executor e sobre o criador das regras impostas a sociedade.

Separação Material entre Estado e Igreja no Brasil


Com a ascensão dos militares e dos republicanos ao poder em 1889, com a Proclamação da República houve no ano seguinte a separação material entre a igreja e o Estado, assegurando posteriormente com a promulgação da 1ª Constituição Brasileira da era Republicana em 1891. Sob a influência de Rui Barbosa o texto magno previa a separação do Estado e da Religião, assim como a liberdade religiosa. Para Rui Barbosa, "de todas as liberdades sociais, nenhuma é tão congenial ao homem, e tão nobre, e tão frutificativa, e tão civilizadora, e tão pacífica, e tão filha do Evangelho, como a liberdade religiosa."


Dessa forma o Estado passou a organizar-se separado da hierarquia e da estrutura da igreja Católica, além da abertura para o culto de outras religiões, encerrando o monopólio institucional religioso da Igreja Católica Apostólica Romana. Chegando e difundindo –se nesse período o pensamento espírita, o protestantismo de ordem Calvinista e Luterano, e posteriormente por volta de 1910 os “movimentos evangélicos” de origem norte americana (assembléia de Deus e Batistas) e portenha (Congregação Cristã) via Argentina.


Nesse momento histórico o pensamento católico ainda é forte e influente, mas já não é mais único. O reino dos céus e a moral religiosa católica não são mais únicas e exclusivas, existem agora em menor escala, mas em crescente ascensão uma nova forma de pensar e de se relacionar entre os indivíduos e a sociedade. Essa liberdade permitida por normalização legal acaba criando um a nova maneira de pensar e conseqüentemente de viver em sociedade, abrindo espaço para as mudanças que surgirão a partir da metade do século XIX (Voto feminino, divorcio, trabalho feminino, alfabetização, consumismo) que transformarão a realidade da sociedade brasileira.

Embora influenciado pela Religião o Estado adotava naquele momento histórico algumas postura que contrariam o próprio interesse religioso. Havia outros interesses e outros grupos que controlavam e influíam nas decisões do governo e do parlamento. A religião perde força sobre o Estado.
Dessa forma, embora avanços de forma tímida em virtude das grandes desigualdades de acesos as informações e a cultura reinantes no país, as mudanças sociais vão acontecendo e alterando a própria forma de pensar da Religião e da sociedade.


No final da década de 80 do século XX a um movimento inverso do período anteriormente analisado: com o crescimento dos movimentos neopentecostais e da teologia da prosperidade, além da onda carismática católica há uma volta da influencia religiosa nas decisões e nas ações do Estado.
Ministros do evangelho, apóstolos da fé, padres, reverendos, pastores se lançam ao parlamento e aos cargos públicos com a missão de evangelizar o Estado. Procuram defender suas convicções religiosas por intermédio da intervenção e da chancela do Estado.


Instituições religiosas se aliam a partidos políticos, lançam e apóiam candidatos com intuito de influir nas decisões do Estado e saborear as benesses do poder. Demarcando claramente um retrocesso na evolução da cultura política no país. A sociedade que lutou para a separação de Estado e Religião, agora cada qual ao seu modo e rebanho luta para incluir no Estado a sua visão religiosa nas leis e no ordenamento jurídico nacional.

Conclusão

Após a exposição do ambiente histórico que corroborou para a construção e desconstrução do Estado religioso no Brasil, bem como do nascente movimento que visa incluir novamente a Religião na pauta da atividade estatal, fica clara a necessidade não só da separação material do Estado e da Religião, mas principalmente e fundamentalmente a urgente necessidade de separação conceitual.


Separar conceitualmente Estado e Religião é buscar a laicidade do Estado bem como a não politização da fé. As ações de Estado devem visar o bem comum de toda a sociedade, a lei deve ser para a coletividade, respeitando sua função social de promotora da justiça e inibidora da desigualdade. A Religião deve cuidar das coisas espirituais, da moral, da ética pública, de valores individuais humanamente importantes na vida social.


Um Estado laico materialmente e conceitualmente é a garantia mor da preservação da liberdade religiosa, o que poderia soar de maneira paradoxal, mas que na realidade vem apenas ratificar que a melhor maneira de manter a Religião livre é afastando- a do Estado, e de igual modo é melhor maneira de manter o Estado independente é afastando –o da Religião.

Referências


ALVES, Ricardo. República e Laicidade. Associação Cívica República e Laicidade, Lisboa, Jan 2003. Disponível http://www.laicidade.org/documentacao/textos-criticos-tematicos-e-de-reflexao/aspl/ 28 set.2010.
BRASIL. Constituição 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado .1988
DOWER, Nelson Godoy Bassil. Instituições do Direito Público e Privado. São Paulo : Nelpa, 2001
LENZA, Pedro. Direito constitucional Esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2009.
LIMA, Fernando Machado da Silva. Separação entre Igreja e Estado. Jusnavegandi, Teresina, ano 6, n. 52, Nov 2001. Disponível . Acesso em: 28 set. 2010.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

OS DOIS GRANDES VENCEDORES DAS ELEIÇÕES 2010 EM ITURAMA: CLÁUDIO BURRINHO E VALDECIR PICHIONI


Ex-Prefeito Valdecir Pichioni


Prefeito Claudio Burrinho

Passado do trabalho extenuante, a apreensão da apuração até a euforia da comemoração, fica a grande incógnita: quem venceu a eleição em Iturama? Quem perdeu? Qual o efeito desses resultados para o futuro político de Iturama? A análise comparativa das eleições de 2006 e 2010, pelo menos estatisticamente, nos dão uma clara noção de possíveis respostas as perguntas elencadas.

Na eleição de 2006 o candidato a deputado federal Aelton Freitas, então filiado ao PL (Partido Liberal) foi majoritário junto ao eleitorado de em Iturama, obtendo 9.653 votos (51,748%). Em 2010, Aelton Freitas, agora no PR (Partido da República), manteve a o 1º lugar na preferência do eleitorado ituramense, com 7.216 votos (35.5%). Analisando apenas os números, houve uma perda de 2.473 votos (16%) de uma eleição para a outra.

Nárcio Rodrigues candidato a deputado federal pelo PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira) na eleição de 2006 obteve em Iturama 4.467 votos (23,974%), consolidando-se como o 2º mais votado. Em 2010 o resultado eleitoral apresentou uma acentuada queda: Nárcio recebeu em Iturama 2.244 votos (11,93%). Ainda analisando apenas os números houve uma perda de 2.223 votos (12,04%) de uma eleição para a outra.

Gilmar Machado candidato a deputado federal pelo PT (Partido dos Trabalhadores) na eleição de 2006 recebeu 448 votos (2,391%) em Iturama. Já em 2010 o candidato obteve 1.035 votos (5,09%). Os números apontam um significativo crescimento de 589 votos (2,70%) de uma eleição para outra.

Paulo Piau candidato a deputado federal em 2006 pelo PPS (Partido Progressista Socialista) recebeu em Iturama 532 votos (2,852%). Nas eleições de 2010, agora filiado ao PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro) o candidato recebeu 420 votos (2,07%). Uma pequena queda de 112 votos (0,78%) de uma eleição para a outra.

Marcos Montes candidato a deputado federal em 2006 pelo PFL (Partido da Frente Liberal) recebeu em Iturama 16 votos (0,086%). Agora nas eleições de 2010, candidato pelos Democratas, recebeu em Iturama 178 votos (0,88%). Um crescimento de 162 votos (0,794%) de uma eleição para a outra.
Nas eleições de 2010 tivemos como fator novo na corrida pela Câmara Federal a candidatura de Zé Silva (Ex –presidente da Emater-MG) pelo PDT (Partido Democrático Trabalhista), apoiada por produtores rurais e pelo ex- prefeito Valdecir Pichioni, obtendo em Iturama 6.417 votos, ou seja 31,57% do votos para deputado federal, dessa foram se configurando com o 2º mais votado em Iturama.

Maia candidato a deputado estadual em 2006 pelo PSDB recebeu em Iturama 10.485 votos (57,935%). Nas eleições de 2010 a candidatura do mesmo recebeu dos eleitores de Iturama 8.199 votos (46,85%). Queda de 2.286 votos (11,085%) de uma eleição para a outra.

Analisando os números das duas eleições podemos propor algumas conjecturas sobre resultado das eleições em Iturama, são elas:

1) Os votos para deputado federal foram os mais disputados nesta eleição do que na anterior;
2) Aelton Freitas mesmo numa eleição mais disputada e pulverizada conseguiu manter a liderança em Iturama;
3) O apoio e o empenho do Prefeito Claudio Burrinho foi fundamental na votação obtida por Aelton Freitas;
4) O ex-prefeito Valdecir Pichionni, que emprestou seu cacife político a candidatura de Zé Silva, sai fortalecido das eleições;
5) Gilmar Machado, Zé Silva e Marcos Montes tiraram votos de Paulo Piau e Nárcio Rodrigues e Aelton Freitas ;
6) Zé Maia foi quem mais perdeu com a candidatura de Gisélia Freitas e de Romão;
7) O PSDB se desidratou nestas eleições em Iturama: foi o que mais perdeu

Aliás, vale ressaltar que o eleitorado de Iturama cresceu, assim como o número de abstenções nesta eleição. Em 2006 o eleitorado era de 23.772, compareceram as urnas 19.498 eleitores, ou seja 4.274 eleitores não foram votar. Já em 2010 o eleitorado passou para 26.701, compareceram as urnas 21.339 eleitores, não participaram da festa da democracia 5.382 eleitores.



Fonte: Site do TSE e TRE -MG

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

OS CARAS DE PAU

Artigo publicado por Mary Zaidan


A política sempre atraiu caras-de-pau. Tem centenas deles por aí. E não são apenas os folclóricos Tiririca, Mulher Pera ou Mulher Melão. São os Collor de Mello, “o defensor dos descamisados”, Paulo Maluf, que mesmo pego com a boca na botija insiste que não tem dinheiro no exterior, José Dirceu, “vítima de golpismo”, e outros tantos Sarneys, Jaders, Newtões, Renans ou Arrudas. Mas difícil será bater Joaquim Roriz, um dos ícones entre os fichas sujas, banido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e responsável pelo recurso que provocou o julgamento de 0 x 0, ou melhor, de 5 x 5, no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a validade ou não da lei Ficha Limpa nas eleições deste ano.
Com uma velocidade impressionante - menos de 24 horas depois da longa sessão do STF que deveria definir o destino não só de Roriz, mas dos demais candidatos espremidos na cesta suja -, o ex-governador renunciou à sua candidatura e colocou sua mulher, dona Weslian, como substituta. Distribuiu um manifesto abominável, uma verdadeira afronta aos eleitores do Distrito Federal e a todos os brasileiros, e ainda teve o desplante de confirmar, com todas as letras, que escolhia uma candidata-laranja para o seu lugar: “a eleição correrá em meu nome e o povo de Brasília me honrará, elegendo minha amada esposa...”.
Na entrevista à imprensa, recheada de impropérios, alguns beirando a doidice pura, como o de dizer que existia uma “orquestração” para instalar o socialismo no Brasil e que ele seria um entrave, Roriz deve ter provocado engulhos até nos seus correligionários: "Nunca avancei sobre o patrimônio público, nunca sujei minha mão na lama onde chafurdam os corruptos".
Ainda que provoque asco, o episódio Roriz é pedagógico. Por um lado sabe-se que a renúncia só ocorreu porque ele vislumbrou a proximidade de sua primeira derrota eleitoral, e ainda por cima para o petista Agnelo Queiroz. Por outro, mostra que, mesmo se não valer para o próximo domingo, a existência do Ficha Limpa e o entendimento do TSE sobre a lei, impugnando candidatos, já funcionou como alerta para o eleitor. Líder absoluto nas pesquisas por meses a fio, Roriz despencou devido a sua ficha suja, seja ela constitucional ou não, válida ou não para 3 de outubro.
Outra lição, e essa mais funda, tem a ver com a frouxidão moral de que o país se tornou refém. Se sempre mostrou ser cara-de-pau, Roriz desta vez foi mais longe possivelmente porque a sensação de impunidade – ou a impunidade real – é cada vez maior. Se nada acontece nem mesmo quando o presidente da República infringe descaradamente a lei, por que aconteceria algo com um ex-governador, um mero candidato, ainda por cima historicamente popular?
Se o presidente Lula pode dizer que o mensalão foi golpe para depô-lo, se comparando a Getúlio, Jango e Juscelino – e assim o fez na entrevista ao Portal Terra, concedida na última quinta-feira – por que Roriz não falaria sandices como a de armação de um golpe socialista? Uma afirmação tão ou mais surrealista que a outra. Se o presidente acusa a mídia de persegui-lo, por que Roriz não usaria argumento semelhante?
Para os mais afoitos, ressalta-se que nem de longe Lula pode ser comparado a Roriz.
Mas, ao insistir em desrespeitar todo o tipo de regras para vencer o jogo, a qualquer preço e custe o que custar, o presidente abriu um caminho perigosíssimo: jogou leis no lixo, abusou do cargo, praticou e avalizou o vale-tudo. Estimulou os caras-de-pau e, ainda que sua candidata vença, como tudo indica, perdeu a chance de descer a rampa do Planalto de cara limpa.


Mary Zaidan é jornalista, trabalhou nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, em Brasília. Foi assessora de imprensa do governador Mario Covas em duas campanhas e ao longo de todo o seu período no Palácio dos Bandeirantes. Há cinco anos coordena o atendimento da área pública da agência 'Lu Fernandes Comunicação e Imprensa

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

LEI FICHA LIMPA NA VISÃO DE EROS GRAU

"O trânsito em julgado não é inatingível"

A seguir, trechos da entrevista concedida ao "Estado de S.Paulo" por Eros Grau. São opiniões firmes, claras e nada temerosas, que deixam claro que o Brasil precisa de mais magistrados como ele. Para o agora ex-ministro, a Lei da Ficha Limpa, por exemplo, "é francamente, deslavadamente inconstitucional".

- Para Eros Grau, o que é ficha limpa?

- "Ficha limpa" é qualquer cidadão que não tenha sido condenado por sentença judicial transitada em julgado. A Constituição do Brasil diz isso, com todas as letras.

- Políticos corruptos não são uma ameaça aos cofres públicos e ao estado de direito?

- Sim, sem nenhuma dúvida. Políticos corruptos pervertem, são terrivelmente nocivos. Mas só podemos afirmar que este ou aquele político é corrupto após o trânsito em julgado, em relação a ele, de sentença penal condenatória. Sujeitá-los a qualquer pena antes disso, como está na Lei Complementar 135 (Ficha Limpa), é colocar em risco o estado de direito. É isto que me põe medo.

- O que está em jogo não é a moralidade pública?

- Sim, é a moralidade pública. Mas a moralidade pública é moralidade segundo os padrões e limites do estado de direito. Essa é uma conquista da humanidade. Julgar à margem da Constituição e da legalidade é inadmissível. Qual moralidade? A sua ou a minha? Há muitas moralidades. Se cada um pretender afirmar a sua, é bom sairmos por aí, cada qual com seu porrete. Vamos nos linchar uns aos outros. Para impedir isso existe o direito. Sem a segurança instalada pelo direito, será a desordem. A moralidade tem como um de seus pressupostos, no estado de direito, a presunção de não culpabilidade.

- A profusão de liminares concedidas a candidatos, inclusive pelo Supremo, não confunde o eleitor?

- Creio que não. Juízes independentes não temem tomar decisões impopulares. Não importa que a opinião publicada pela imprensa não as aprove, desde que elas sejam adequadas à Constituição. O juiz que decide segundo o gosto da mídia não honra seu ofício. De mais a mais, eleitor não é imbecil. Não se pode negar a ele o direito de escolher o candidato que deseja eleger.

- Muitos partidos registraram centenas de candidaturas mesmo sabendo que elas poderiam ser enquadradas na Lei 135/2010, que barra políticos condenados por improbidade ou crime. Não lhe parece que os partidos estão claramente atropelando a Lei da Ficha Limpa, esperando as bênçãos do Judiciário?

- Não, certamente. O Judiciário não existe para abençoar, mas para aplicar o direito e a Constituição. Muito pior do que corrupto seria um juiz, medroso, que abençoasse. Estou convencido de que a Lei Complementar 135 é francamente, deslavadamente inconstitucional.

- Como aguardar pelo trânsito em julgado se na esmagadora maioria das ações ele é inatingível?

- O trânsito em julgado não é inatingível. Pode ser demorado, mas as garantias e as liberdades públicas exigem que os ritos processuais sejam rigorosamente observados.

- A Lei da Ficha Limpa é resultado de grande apelo popular ao qual o Congresso se curvou. O interesse público não é o mais importante?

- Grandes apelos populares são impiedosos, podem conduzir a chacinas irreversíveis, linchamentos. O Poder Judiciário existe, nas democracias, para impedir esses excessos, especialmente se o Congresso os subscrever.

- Não teme que a Justiça decepcione o País?

- Não temo. Decepcionaria se negasse a Constituição. Temo, sim, estarmos na véspera de uma escalada contra a democracia. Hoje, o sacrifício do direito de ser eleito. Amanhã, o sacrifício do habeas corpus. A suposição de que o habeas corpus só existe para soltar culpados levará fatalmente, se o Judiciário nos faltar, ao estado de sítio.

- O senhor teme realmente uma escalada contra a democracia?

- Temo, seriamente, de verdade. O perecimento das democracias começa assim. Estamos correndo sérios riscos. A escalada contra ela castra primeiro os direitos políticos, em seguida as garantias de liberdade. Pode estar começando, entre nós, com essa lei. A seguir, por conta dessa ou daquela moralidade, virá a censura das canções, do teatro. Depois de amanhã, se o Judiciário não der um basta a essa insensatez, os livros estarão sendo queimados, pode crer.

- Por que o Supremo Tribunal Federal nunca, ou raramente, condena gestores públicos acusados por improbidade ou peculato?

- Porque entendeu, inúmeras vezes, que não havia fundamentos ou provas para condenar.

- Que críticas o senhor faz à forma do Judiciário decidir?

- As circunstâncias históricas ensejaram que o Judiciário assumisse uma importância cada vez maior. Isso pode conduzir a excessos. O juiz dizer que uma lei não é razoável! Ele só pode dizer isso se ele for deputado ou senador. Os ministros não podem atravessar a praça (dos Três Poderes, que separa o Supremo do Congresso). Eu disse muitas vezes isso lá: isso é subjetivismo. O direito moderno é a substituição da vontade do rei pela vontade da lei. Agora, o que se pretende é que o juiz do Supremo seja o rei. É voltar ao Século 16, jogar fora as conquistas da democracia. Isso é um grande perigo.

- Isso tem acontecido?

- Lógico. Inúmeras vezes o tribunal decidiu, dizendo que a lei não é razoável. Isso me causa um frio na espinha. O Judiciário tem que fazer o que sempre fez: analisar a constitucionalidade das leis. E não se substituir ao legislador. Não fomos eleitos.

- O senhor tem coragem de votar em um político com ficha suja?

- Entendido que "ficha-suja" é unicamente quem tenha sido condenado por sentença judicial transitada em julgado, certamente não votarei em um deles. Importante, no entanto, é que eu possa exercer o direito de votar com absoluta liberdade, inclusive para votar em quem não deva.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

ALTERAÇÃO DE PRAZO PRESCRICIONAL DA PRETENSÃO PUNITIVA - LEI Nº 12. 234 /2010

Escrito por Prof Damásio de Jesus

Um dos temas mais importantes do Direito Penal consiste na determinação do início do prazo da extinção da pretensão punitiva e executória, isto é, do direito de punir do Estado.

Com a entrada em vigor da norma incriminadora, surge o jus puniendi abstrato, consubstanciado na possibilidade de o Estado, seu titular, exigir que as pessoas se abstenham de realizar a conduta nela descrita. Praticado o delito, entra em cena o jus puniendi in concrecto, também designado de pretensão punitiva, que não é, contudo, perene. Cedo ou tarde se extinguirá, seja em face da execução da pena ou pela superveniência de outra causa. Os fatores que fulminam a pretensão punitiva, obstando sua concretização, estão, em sua maioria, previstos no art. 107 do Código Penal (CP), destacando-se, dentre eles, a prescrição, que se verifica com o decurso do tempo sem que o Estado exerça seu poder-dever de punir. Divide-se em prescrição da pretensão punitiva (art. 109) e executória (art. 110), conforme ocorra antes ou depois do trânsito em julgado da sentença condenatória.
Em relação à prescrição da pretensão punitiva, seu prazo é calculado, de regra, tomando-se em consideração a pena máxima cominada ao crime, confrontada com os incisos do art. 109 do CP.
A recente Lei n. 12.234, de 5 de maio de 2010, que entrou em vigor na data de sua publicação, 6 de maio, modificou parcialmente o regime da prescrição: elevou o prazo prescricional nos crimes de pena máxima não superior a um ano: de dois para três anos (art. 109, VI). Assim, o prazo, que era de dois anos antes da lei nova, passa para três. Essa modificação se reflete sobre todas as modalidades de prescrição, vale dizer, sobre os prazos da prescrição da pretensão punitiva e executória.
Qual o fundamento da modificação? Cremos que ocorreu o seguinte: o Estado, em vez de dotar o sistema judiciário criminal com meios suficientes para a entrega rápida da prestação jurisdicional, aumentou o prazo da prescrição. É uma confissão, como se reconhecesse: em certos crimes, é muito exíguo o prazo prescricional de dois anos entre o fato e a denúncia ou entre esta e a sentença; vamos passar para três.
A norma alterada configura novatio legis in pejus. É irretroativa. O aumento do prazo apresenta natureza gravosa, de modo que se aplica exclusivamente a fatos praticados a partir da entrada em vigor da nova Lei, ou seja, do dia 6 de maio de 2010.
Note-se que passaram a existir dois regimes jurídicos de prescrição:
Primeiro: incidente sobre infrações penais ocorridas até 5 de maio, segue os moldes anteriores, vale dizer, o prazo prescricional, quando a pena (máxima ou aplicada) for inferior a um ano, será de dois anos.
Segundo: relativo aos ilícitos penais cometidos a partir de 6 de maio de 2010, o prazo do art. 109, VI, do CP, será de três anos.